China “a posteriori” V


O repouso dos portugueses

Relaxar. É isso que nos dizem os guias a respeito de Yangshuo. E o verbo não deixa de soar estranho para quem está de férias há 22 dias. Mas a ideia de ter um intervalo, e poder descansar da própria China – tão estafante para qualquer viajante, com as suas dificuldades linguísticas e distâncias intermináveis -, facilmente nos convence e ganha as devidas proporções quando fazemos o check-in no Yangshuo Mountain Retreat.
Este pequeno hotel, acomodado junto ao rio Li, numa aldeia a uma hora de autocarro da cidade de Guillin, capital de Guangxi, no sul da China, tem uma envolvência familiar e a sua taxa de ocupação é, seguramente, 100 por cento estrangeira. O charme da unidade hoteleira, bem ao jeito do clima semi-tropical que aqui se vive, é facilmente detectado e a mim só me vêm recordações da Jamaica. São as canoas de bambu que descem o rio, ao sabor da corrente pausada do caudal, e os aposentos vestidos de tons terra, com as suas varandas viradas para o verde intenso dos picos de karst, que acordam a memória com imagens de outras paragens. Mas Yangshuo é autêntico e recusa comparações mais prolongadas. A paisagem natural serve como garantia de que estamos em mais um cenário de rara beleza, muito provavelmente o único no mundo onde existe uma sucessão desmedida de montanhas que brotam do fundo do rio, com as suas constantes formações de calcário.
Andar de bicicleta no meio desta paisagem, onde a ruralidade anda de mão dada com uma tranquilidade que até então desconhecíamos nos chineses, é um passeio obrigatório.  As rotas do mapa artesanal, feito à mão por alguém que ainda não apurou o talento do desenho a lápis de carvão, desviam-nos muitas vezes do caminho aconselhado e o desequilíbrio nos estreitos trilhos entre os arrozais acusam mazelas nas pernas. Pelo menos nas minhas, cujo atrevimento falou mais alto e não cedeu à pouca prática em cima de duas rodas.
A par disso, Yangshuo ainda oferece montanhismo para os mais aventureiros, caminhadas, visitas a grutas cheias de lama, massagens revigorantes de uma hora que nós fizemos no nosso quarto com vista para a montanha, e passeios demorados nas tais canoas de bambu que me lembram a Jamaica, tal a semelhança na construção e na calmaria que este “rafting”, chamam-lhe os jamaicanos e os chineses, proporciona. Mas o prazer maior deste repouso semi-tropical só chegou ao final do primeiro dia, quando a pronúncia de um casal de turistas, que falava inglês com o responsável holandês do hotel, me fez desconfiar da sua origem. Bastou ouvirmos os nomes Dora e Rui para percebermos que estávamos entre iguais, sendo a língua e os interesses comuns suficientes para a criação de uma amizade que deve ser cobrada em Portugal.

@ Alexandra Ho

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